Colabore com o Futuro defende a inclusão de tratamento para hipercolesterolemia primária no rol da ANS
- Mayara Figueiredo Viana
- há 1 hora
- 9 min de leitura

Em audiência pública da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) realizada nesta quarta-feira (19/11), a Colabore com Futuro, representando o Grupo de Advocacy Cardiovascular (GAC) defendeu a inclusão do Inclisirana, indicado para adultos com hipercolesterolemia primária ou dislipidemia mista que, mesmo em uso de estatinas na dose máxima tolerada e eventualmente ezetimiba, mantêm LDL acima de 100 mg/dL.
O tratamento foi submetido pela Novartis à análise da ANS, e recebeu recomendação preliminar desfavorável, baseada em evidências que mostram não haver redução significativa de eventos cardiovasculares maiores, apesar de apresentar queda superior a 50% nos níveis de LDL nos estudos avaliados. A tecnologia segue em consulta pública até 24 de novembro, com todos os documentos disponíveis para análise.
Segundo a agência, os estudos apontaram segurança geral adequada, predominando reações leves no local da injeção e taxas semelhantes de efeitos adversos graves entre inclisirana e placebo. No campo econômico, estimou-se impacto anual médio de R$ 1,12 bilhão para cerca de 110 mil potenciais pacientes, número muito superior à estimativa apresentada pela empresa, reforçando a necessidade de contribuições sociais para melhor definir a população-alvo e subsidiar a decisão final.
Andréa Bento – Colabore com o Futuro / Grupo de Advocacy Cardiovascular (GAC)
Andréa Bento representou o Grupo de Advocacy Cardiovascular e destacou que diversas organizações de pacientes participaram da construção da discussão sobre a inclisirana, reforçando que a tecnologia está sendo avaliada como terceira linha de tratamento para um grupo restrito de pessoas em prevenção secundária, que já utilizam estatinas e ezetimiba, mas continuam em alto risco. Ela enfatizou que se trata de “uma população pequena, grave e com metas muito claras”, composta por pacientes que “apesar de seguir todas as recomendações e usar estatinas corretamente, não conseguem reduzir o colesterol”, destacando que essa condição demonstra por que a inclisirana deve ser tratada como uma alternativa indispensável nesse cenário. Para Andréa, “essa condição demonstra por que a inclisirana deve ser analisada como uma opção terapêutica essencial quando todas as alternativas anteriores falharam”, oferecendo uma possibilidade real de controle para um grupo que enfrenta limitações severas e permanece sem outras soluções eficazes.
Iônia Oliveira – Representante da Proponente (Novartis)
Iônia Oliveira explicou como foi estruturada a estimativa de pacientes que poderiam se beneficiar do tratamento, destacando que a indicação da tecnologia é restrita a pessoas em prevenção secundária, ou seja, que já tiveram infarto, passaram por cirurgia de revascularização ou apresentam obstrução coronariana significativa, e que mesmo usando estatinas e ezetimiba permanecem com LDL elevado. Ela detalhou o funil epidemiológico utilizado, baseado em dados do IBGE, estudos nacionais como o ELSA e informações de prescrição e adesão às estatinas, ressaltando que muitos estudos citados no debate não refletem a realidade da saúde suplementar nem garantem que os pacientes estavam em uso adequado das terapias de base. Para Iônia, “é fundamental usar dados que representem quem realmente faz uso correto do tratamento, porque a tecnologia só faz sentido para um grupo muito específico e bem definido de pacientes”.
Talita Barbosa – Conselho Federal de Farmácia (RJ)
Thalita Barbosa, farmacêutica e conselheira federal pelo Rio de Janeiro, ressaltou sua experiência na atenção primária e na coordenação de 35 farmácias municipais para destacar que a tecnologia debatida já é adotada em mais de 30 países, como Inglaterra, Austrália e Estados Unidos, onde inclusive é utilizada para algumas condições graves como AVC. Ela lembrou que o medicamento é destinado apenas a pacientes em situação crítica, que já seguiram todas as orientações médicas, mantiveram adesão ao tratamento e ainda assim não alcançam controle adequado. Para Thalita, “é absurdo não olharmos para a prevenção, especialmente quando se trata de uma das doenças que mais matam no nosso país”, reforçando que muitos desses pacientes já não têm outra opção terapêutica disponível.
Tiago Farina Matos – Advogado Sanitarista
Tiago Farina Matos apontou fragilidades estruturais no processo de análise da tecnologia avaliada, destacando que a reunião da Cosaúde teve cinco apresentações extensas e não abriu espaço real para debate técnico. Ele classificou como muito preocupante a discrepância das estimativas de impacto orçamentário do tratamento, enfatizando que “os cálculos variaram de 400 milhões de reais a 5,6 bilhões de reais”, e afirmou que “não é possível decidir sobre uma tecnologia com estimativas tão discrepantes, porque alguém está errado e isso precisa ficar claro antes da deliberação”. Para Tiago, essa diferença expressiva demonstra insegurança metodológica, reforçando a necessidade de a ANS buscar apoio de instituições com expertise epidemiológica e criar mecanismos que garantam discussões técnicas mais qualificadas.
Paulo Behr – Santa Casa de Porto Alegre
Paulo Behr apresentou a experiência clínica da Santa Casa de Porto Alegre com a inclisirana, relatando que 36 pacientes já utilizam o medicamento desde 2024, todos em prevenção secundária após infarto e já tratados com estatina potente e ezetimiba, mas ainda com LDL acima de 100 mg/dL. Ele explicou que o centro estima que uma parcela pequena, porém significativa, desses pacientes permanece com LDL elevado mesmo seguindo o tratamento recomendado. Paulo ressaltou que “entre 5% e 8% dos pacientes infartados permanecem com LDL elevado apesar do tratamento convencional, e que a inclisirana tem se mostrado um medicamento potente, reduzindo o LDL em mais de 50% na maioria dos casos”, reforçando que isso pode evitar novos infartos, melhorar a adesão graças à aplicação semestral e reduzir custos associados a eventos cardiovasculares graves.
José Francisco – Sociedade Brasileira de Cardiologia (Departamento de Aterosclerose)
José Francisco, cardiologista e representante do Departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia, reforçou que a relação entre colesterol elevado e doença aterosclerótica é amplamente comprovada e que décadas de intervenções mostram que reduzir o LDL diminui infartos, AVC e mortalidade. Ele recordou a evolução das terapias ao longo dos anos, desde estatinas de alta potência e ezetimiba até os inibidores de PCSK9, destacando que as diretrizes brasileiras hoje recomendam metas cada vez mais baixas para pacientes de alto risco. Ao defender a importância da inclisirana para o SUS suplementar, “ele explicou que, após décadas de evolução das terapias, desde estatinas, ezetimiba, PCSK9 até novas moléculas, a inclisirana se soma a esse arsenal como opção para pessoas que já esgotaram todas as tentativas convencionais de prevenção e controle”, ressaltando que esses pacientes perderam todas as oportunidades anteriores de impedir a progressão da doença e agora precisam de terapias eficazes, seguras e com alta adesão garantida por duas aplicações ao ano.
Denise Blaques – Instituto Lado a Lado pela Vida
Denise Blaques explicou que a inclisirana não é uma opção para toda a população, mas sim para um perfil muito específico e grave, formado por indivíduos que perderam oportunidades de prevenção e agora enfrentam risco elevado de novos eventos fatais. Denise questionou por que ainda há dúvida sobre a viabilidade da tecnologia, considerando a gravidade desses casos e a falta de alternativas terapêuticas eficazes. Para ela, “a não incorporação da inclisirana mantém essas pessoas nas estatísticas de mortalidade por eventos cardiovasculares e impede que tenham melhor qualidade de vida e redução real do risco de novos infartos”, defendendo que sua inclusão no rol pode mudar significativamente o cenário da doença cardiovascular no Brasil.
Eduardo Lima – Instituto do Coração (InCor)
Eduardo Lima ressaltou que a relação entre LDL elevado e doença aterosclerótica é amplamente comprovada e que a redução do colesterol está diretamente associada à diminuição de eventos cardiovasculares, premissa que embasa a aprovação da inclisirana por agências regulatórias de países como Inglaterra, Austrália e Canadá. Eduardo enfatizou que outras especialidades já avançaram na incorporação de tecnologias de maior custo com impacto comprovado em desfechos clínicos, e que a cardiologia precisa seguir pelo mesmo caminho, pois a dislipidemia é silenciosa e seu “sintoma” costuma ser o infarto ou o AVC. Para ele, “a inclisirana oferece uma redução de cerca de 50% do LDL e representa a maior oportunidade de prevenção de novos eventos cardiovasculares para pacientes que já esgotaram todas as alternativas convencionais”, reforçando que gostaria de ter a possibilidade de prescrever essa terapia no Brasil, assim como ocorre em outros sistemas de saúde comparáveis.
Fabiana Rached – Departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia
Fabiana Rached explicou que “a inclisirana promove reduções expressivas de LDL, acima de 40 a 50 mg/dL, alinhando-se às evidências internacionais que associam essa queda à diminuição de eventos graves”. Lamentou que menos de 10% dos pacientes brasileiros de alto risco atingem suas metas com as terapias atuais e defendeu que novas opções terapêuticas precisam estar disponíveis para alterar esse cenário de baixa adesão, falta de acesso e controle inadequado, reforçando a urgência de incorporar tecnologias capazes de reduzir o impacto da doença cardiovascular no país.
Bruno Mioto – Cardiologista do Instituto do Coração (InCor)
Bruno Mioto explicou que atende majoritariamente pacientes com doença coronariana crônica e realizou um levantamento próprio para identificar quantos deles seriam elegíveis ao uso da inclisirana. Constatou que menos de 2% dos seus pacientes se enquadram nos critérios, mas destacou que justamente esse grupo representa os casos mais graves, formados por pessoas que mantêm LDL acima de 100 mg/dL apesar do uso de estatinas e ezetimiba, e que, por isso, acumulam as maiores taxas de hospitalização e eventos recorrentes. Ele reforçou que esse é o perfil que mais se beneficia de terapias capazes de reduzir agressivamente o colesterol e relatou o depoimento de um paciente que, após dois infartos e mesmo seguindo o tratamento convencional, só alcançou níveis adequados de LDL e melhoria real na qualidade de vida após iniciar a inclisirana, mantendo colesterol abaixo de 50 mg/dL nos últimos dois anos. Para Bruno, “esse é o tipo de paciente que mais sofre com eventos repetidos e que mais precisa de tecnologias que reduzam o risco e garantam qualidade de vida”, defendendo que a incorporação da inclisirana permitirá tratar de forma efetiva quem realmente está em maior perigo e tem mais a ganhar com a redução expressiva do LDL.
Patrícia de Luca – Pessoa com Hipercolesterolemia Familiar
Patrícia de Luca, pessoa com hipercolesterolemia familiar, destacou que muitos pacientes da saúde suplementar têm seus níveis analisados com base em dados do SUS, onde o acesso às terapias essenciais é limitado, o que distorce estimativas e leva a conclusões equivocadas sobre impacto orçamentário. Patrícia reforçou que pessoas com hipercolesterolemia familiar enfrentam uma condição fisiológica que impede a resposta plena ao tratamento convencional, e que o cuidado precisa incluir prevenção, rastreamento familiar e monitoramento contínuo. Para ela, “é fundamental avaliar pacientes que realmente estão em tratamento adequado, porque só assim é possível entender quem de fato precisa da inclisirana”, defendendo que a tecnologia representa uma alternativa necessária para um grupo específico que, mesmo seguindo todas as recomendações, continua exposto a altos riscos cardiovasculares.
Daniel Gasparetti – Paciente
Daniel Gasparetti relatou sua experiência pessoal convivendo com uma condição cardiovascular grave, agravada pelo HIV e por múltiplos procedimentos médicos que já precisou realizar, incluindo colocação de stents e intervenções recentes para tratar complicações arteriais. Ele explicou que sua doença é progressiva e que a velocidade dessa progressão depende diretamente do controle do colesterol, ressaltando que não consegue acessar terapias mais recentes por causa do custo, apesar de já estar no limite máximo do tratamento convencional. Daniel destacou que a diferença entre controlar adequadamente o LDL e não controlar significa voltar ao hospital em “2 ou 3 anos” ou somente “em 10 anos”, com impacto direto na sua qualidade de vida, longevidade e na própria sustentabilidade financeira do plano de saúde. Para ele, “a diferença entre tratar ou não tratar é a distância entre ver meu neto se formar ou voltar ao hospital em poucos anos”, reforçando que a incorporação da inclisirana poderia reduzir recorrências, diminuir internações custosas e oferecer uma chance real de estabilizar a doença para pacientes que já esgotaram outras opções.
Luiz Henrique – Faculdade de Medicina da USP / Incor
Luiz Henrique reforçou a urgência de opções mais efetivas na redução do colesterol, explicou que “incorporar novas terapias como a inclisirana é essencial para impedir que esses casos avancem para estágios irreversíveis e profundamente debilitantes”, defendendo que ampliar o acesso a tratamentos inovadores é fundamental para evitar sofrimento prolongado, reduzir internações e oferecer melhor qualidade de vida a quem já enfrenta risco cardiovascular extremo.
Marcelo Linhares – CardioBrain / Hospital Santa Catarina de Blumenau
Marcelo Linhares apresentou dados da prática clínica e de estudos conduzidos por sua equipe, destacando que o número de pacientes que realmente necessitam da inclisirana é muito menor do que o estimado inicialmente, com apenas 29 pacientes utilizando a terapia entre mais de 46 mil consultas realizadas no último ano. Ele explicou que seu grupo acompanha mais de 650 pacientes pós-infarto em estudo sobre adesão e metas de LDL, observando que a proximidade com o cardiologista aumenta significativamente o alcance das metas, mas que ainda existe um grupo reduzido de alto risco que permanece com LDL inadequado apesar do tratamento máximo. Marcelo alertou que “a baixa adesão às terapias tradicionais não pode ser usada como argumento para negar acesso a quem realmente necessita”, ressaltando que esses pacientes graves continuam vulneráveis a novos eventos cardiovasculares e que terapias como a inclisirana podem modificar trajetórias clínicas, reduzir internações e, a longo prazo, diminuir custos para o sistema suplementar.
Próximos passos: As contribuições sobre a tecnologia poderão ser enviadas ao longo da consulta pública até 24/11/2025. Após esse período, a equipe técnica da ANS analisará todas as manifestações recebidas e elaborará o relatório final, no qual poderá manter ou revisar a recomendação preliminar desfavorável. Concluída essa etapa, o relatório consolidado será encaminhado à Diretoria Colegiada da ANS (DICOL), que será responsável pela decisão final sobre a inclusão ou não da tecnologia.
Assista à reunião completa








Comentários